Atualidade: Paulo Bento 'Eu sou contra a 'renovação' da seleção nacional'


O que Paulo Bento precisa de conseguir fazer na equipa nacional. E eu acredito que ele conseguirá.



Como escrevi logo a seguir à eliminação de Portugal no Mundial 2014, sou contra a renovação da seleção. 

Claro que a frase anterior é um exagero que procura apenas criar uma reação no leitor. Na verdade, ninguém pode ser contra a renovação, no futebol. Pela simples razão que sem renovação de jogadores o futebol acabaria. Aliás, não adianta ser contra a renovação. Ela sucederá, quer o desejemos muito, pouco ou nada. 

Eu sou contra é esta renovação que se começou a gritar ainda o último apito não tinha soado no Portugal-Gana. Porque esta renovação não passa de uma forma de tentar atingir Paulo Bento e porque é sugerida quase sempre sem análise e sem critério. E sem que exista antes a necessária reflexão. Renovar é um processo complexo e em Portugal tendemos a achar que o único responsável é o selecionador. E não é. 


Antes de renovar, agora sem itálico, é preciso definir algumas coisas. 

1. Qual o próximo objetivo, que riscos estamos dispostos a correr? 

2. Quem pode entrar na seleção? 

3. Quem tem de sair da equipa nacional?

Vou tentar partilhar a minha visão sobre cada um dos pontos.

1. O nosso objetivo só pode ser o apuramento para a fase final do Euro 2016. Faria mais sentido pensar em construir uma seleção para jogar em França. Mas primeiro é necessário chegar a França, ser mais forte do que os outros. Para isso necessitamos de fazer alinhar os melhores. Eu, por exemplo, estaria disponível para apoiar uma ideia diferente: esquecemos o Euro 2016 e pensamos já no Mundial 2018. Mas isto sou eu, que olho para o nosso campo de recrutamento e vejo problemas como nunca antes. Na prática, isto significava o afastamento de muitos jogadores que em 2018 terão mais de 32 anos e a chamada imediata dos que hoje têm 20 a 25. Se queremos que eles cheguem com alguma maturidade ao Mundial é preciso dar-lhes experiência já. Mas admito que esta opção seja excessiva. Talvez o caminho certo seja mais suave, menos radical. E talvez tudo acabe por resolver-se dessa forma. Na entrevista à TVI24 ( vale a pena vê-la na íntegra), Paulo Bento garantiu que a idade não será um critério. Que assim seja. Para os mais velhos e para os mais novos.

2. Claro que há jogadores mais novos que podem começar a entrar nas convocatórias, mas o mais importante é colocá-los no onze, dar-lhes minutos. Admitindo que o caminho será, como reafirmou o selecionador, ir procurando caras diferentes sem fechar a porta, acho que é fundamental olhar para todos os setores. E tocar em todos eles. 

Na baliza estamos tranquilos, com Rui Patrício. Anthony Lopes aparece como o suplente natural. 

Na direita, João Pereira terá 32 anos em 2016. Está no limite. Vale a pena olhar para Cédric e Diogo Figueiras. Além de André Almeida e Miguel Lopes, claro. 

Na esquerda, Fábio Coentrão terá 29 anos na fase final, tal como Antunes. Sílvio é um ano mais novo. 

O centro da defesa é mais complexo. Todos os centrais que jogaram no Brasil ( Bruno Alves, Pepe e Ricardo Costa) terão 33 anos (ou mais…) em 2016. É urgente entregar um dos lugares a Neto (26 anos), já. Não o fazer em Setembro será um erro. Ao seu lado terá de jogar um dos trintões, mas o homem do Zenit terá de ser titular. Custe o que custar. É preciso procurar alternativas. Ilori, por exemplo, mas também Ruben Vezo, Paulo Oliveira e Miguel Rodrigues. Aqui não há tempo a perder e é preciso correr riscos. 

No meio-campo, a titularidade de William Carvalho é óbvia. Restará a Paulo Bento colocar Miguel Veloso no banco ou no lugar de Raul Meireles. Se quiser ir mais longe (dois novos médios…) começará a enfrentar dificuldades. Adrien é uma opção. André Gomes e João Mário, eventualmente. Talvez André Martins, talvez Josué, quem sabe um dia destes Rony Lopes ou Carlos Mané. 

Na frente, fundamental é encontrar um ponta-de-lança. Já se percebeu que Paulo Bento olha para Ronaldo e não vê um ponta-de-lança. Acho que faz mal, mas tudo bem. Se esse é o princípio, será necessário encontrar quem atue na frente. Éder continuará a ser opção, mas tem muito para crescer, como se viu no Brasil. A grande incógnita é Nelson Oliveira. Hoje com 22 anos, seria a escolha evidente. Numa segunda linha está Gonçalo Paciência. Aqui, como no centro da defesa, Paulo Bento terá mesmo de correr riscos, de ir mais longe do que o razoável. Precisará de ver mais do que qualquer um e encontrar a solução. Em 2016, Hélder Postiga e Hugo Almeida terão mais de 32 anos. Um até poderá continuar por lá. Dois é improvável e seguramente indesejável, olhando para o futuro. 

Nas alas a urgência é menor. Nani, Varela, Vieirinha e, claro, Cristiano Ronaldo continuarão por aí. Mas é avisado dar minutos a Rafa, Bebé e Bruma, por exemplo. 

3. O mais aconselhável é não riscar jogadores. Ou seja, não dizer que este, aquele e o outro, mais velhos, deixarão de contar. Por uma questão de bom senso: nunca se sabe quando poderá a seleção necessitar deles. O caso do médio Tiago é exemplar. Depois de uma temporada incrível em Madrid, alguém duvida que teria sido titular no Brasil? A gestão de Paulo Bento terá de ser sobretudo equilibrada e inteligente. Para trazer novos jogadores, o selecionador precisará, obrigatoriamente, de deixar cair alguns dos mais velhos. Mas nada o obriga a que sejam sempre os mesmos. 

Dito isto, é justo escrever um pouco mais sobre de quem é a responsabilidade pelo processo de renovação. 

É evidente que o selecionador tem responsabilidades. Paulo Bento, ou outro, tem ao seu dispor instrumentos que lhe permitem acelerar ou retardar o processo. A convocatória é o maior deles. Nani, por exemplo, foi muitas vezes chamado apesar de não competir com regularidade. Há outros exemplos. Mas isso não sucedeu com Nélson Oliveira, que caiu depois do Euro 2012. Por razões que só o selecionador saberá, desperdiçou a oportunidade de ajudar a crescer o ponta-de-lança. 

Mas, sejamos justos, este poder do selecionador é limitado. A maior parte da ação depende dos clubes e dos próprios jogadores. Das opções de uns e de outros. Das oportunidades. Do rendimento. 

O que a seleção portuguesa consegue resulta do trabalho de todos os que fazem parte do futebol nacional. 

Daqueles que não conseguem encontrar incentivos regulamentares que possibilitem a existência de mais oportunidades para jovens portugueses. Dos dirigentes de clubes que em nenhum momento pensam na equipa nacional. Dos treinadores cujo único interesse, provavelmente legítimo, é ganhar o próximo jogo. E, em resumo, de todos nós que não pressionamos o suficiente, que não criticamos com a dureza necessária quem assim contribui para a diminuição do campo de recrutamento à disposição do selecionador. Seje ele Luís, Carlos, Paulo ou outro qualquer. 

Dito isto, o que devemos exigir a Paulo Bento é que pense além dos dois anos de contrato com a Federação, explique sempre as suas opções e mantenha a mente aberta na altura de convocar e alinhar um onze. Acredito que conseguirá fazê-lo, embora compreenda, face às opções recentes, que muitas pessoas tenham dúvidas. É seguro que o esperam tempos difíceis. A popularidade está mais baixa do que nunca ( basta ver esta votação). As pessoas ficaram cansadas de alguns rostos e sentem uma fome irracional por novidades. Caberá a Paulo Bento encontrar a justa medida da renovação (sem itálico). Sozinho, como está sempre um treinador.

NOTA: este trabalho do Vítor Hugo Alvarenga é um excelente ponto de partida para quem desejar refletir sobre o futuro da seleção nacional. Se quiser discutir o tema comigo, estou pelo Twitter.

Fonte MaisFutebol por Luis Sobral

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